É uma ideia falsa imaginar que, sendo o contrato de matrimônio
feito por espontâneo e mútuo consentimento, poderá também ser desfeito do mesmo
modo. O contrato matrimonial encerra um feito moral de tanta importância, que
não pode ser comparado a qualquer outro.
Mostra-nos o bom-senso que há, na vida, muitos atos irreversíveis.
A vida dos filhos foi gerada por livre e espontânea vontade dos pais que, nem
por isso, podem desfazer-se dela sem cometer um crime.
Só conseguirá paz e durabilidade a vida do casal, se não for
envenenada pelo egoísmo e obstruída pela incompreensão. Cada cônjuge tem que
ajudar o outro, não no sentido de fazer-lhe todas as vontades e satisfazer-lhe
os caprichos, mas com um caráter mais forte e consciente que à primeira vista
pareça até oposição: aceitar o cônjuge com paciência e calma, sem, contudo,
encorajar-lhe as faltas e injustiças. Fugir a tal objetivo constitui
infidelidade.
— Não é para se completarem e aperfeiçoarem que duas pessoas se
casam?
Cada membro da família não deve desviar-se da gravitação de
solidariedade humana. É uma lei natural cuja transgressão implica na arriscada
aventura de não saber viver.
O amor-próprio, originado pelo egoísmo, é a causa dos
desajustamentos matrimoniais, é, na vida, o jogo mais difícil e destruidor.
Para bem da sociedade, de cada cônjuge e principalmente dos
filhos, o casamento deve ser um ato indissolúvel. Tal afirmação se baseia nas
necessidades espirituais da criança, que são absolutas e nada poderá substituí-las.
Sendo satisfeitas, tudo lhe será dado. Boa alimentação e abrigo
contra os elementos é pouco, quanto lhe basta na parte material.
Os filhos, por afeição e instinto, embora muitas vezes sejam
testemunhas de desentendimentos e conflitos, só aceitam os pais unidos, pois
encontram na família o aconchego dos afetos e, no lar organizado, a proteção de
que tanto necessitam. Para eles não há motivos que justifiquem a separação.
O
pai ou a mãe que os abandona como a um traste, esquece-se de que os deixa
inquietos, angustiados, desorientados, ansiosos pela volta daquele que se foi,
embora não o manifestem por palavras. Os professores são espectadores assíduos
desses dramas.
Mas dias virão em que o amor filial se enfraquecerá, quando os
filhos compreenderem que o abandono que tanto os fez sofrer foi a consequência
de uma atitude tão egoísta, que os transformou em órfãos de amor.
Quem poderá negar que na mente dos filhos de pais separados
surjam, como nas faíscas luminosas, estes dizeres: “mas por que nos deixou numa
situação que ele (ou ela) achou insuportável?”
A separação não só fere os filhos, mas mutila cada esposa. E o
mutilado, mesmo procurando reagir, tem sempre presente a cicatriz do cônjuge
amputado.
As desavenças, seja qual for o motivo, não explodem num dia. Vêm
surgindo aos poucos com períodos de calma. Nascem os filhos. O cônjuge
desajustado, mesmo contra a vontade, tem que aceitar o dilema que unidos, embora
em desacordo, tiveram muitos momentos de intimidade. Se houve períodos que os
separaram, também houve os que os integraram, pois foram os construtores de um
lar onde a prole participa de seu corpo e espírito.
Mesmo sem filhos, a separação do casal, se traz alívio, só pode
ser temporário.
Não é possível que o tempo tenha o poder de apagar a lembrança
de uma vida a dois, onde houve comunhão de corpo e espírito. Não se compreende
que uma decisão jurídica apague os rastros físicos e psicológicos de uma vida
em comum.
Separados, procura cada cônjuge construir outra vida, mas com os
farrapos que traz da integridade original.
Separação e angústia
Por Olga Brandão de Almeida
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