;”>Educação não consiste apenas em boas maneiras, é algo mais amplo, mais profundo, porque envolve o desenvolvimento da vontade, os problemas da saúde física, da higiene mental, da formação moral. Olga Brandão de Almeida;

Carta a uma noiva - Por Olga Brandão de Almeida

Recebi, ontem, o convite para seu enlace matrimonial e apresso-me a escrever-lhe.

Algumas reflexões sobre o casamento para quem está às vésperas de casar-se não é nada mau. Isso é que me sugere o assunto desta carta, mas espero que você a receba como prova de afeição.

O momento do “sim” deveria ser acompanhado das seguintes palavras: “Aprenderei a receber meu cônjuge como recebo a vida, sem esperar tudo dele e oferecer-lhe sem obrigar a receber. Serei responsável por ele, mas não o acompanharei nas fraquezas e caprichos”.

Todo drama conjugal, minha querida, resulta do choque do egoísmo: quanto mais forte, mais frágil o elo.

À medida que o egoísta se expande, menos compreende o que se passa com o outro. Torna-se incapaz de adivinhar-lhe os anseios mudos ou declarados.

Casamento é situação de contato que deve ser compreendida no conjunto e nas reações individuais: um ser humano desenvolvendo-se no tempo, a seu lado, mas diferente de você.

Penetre no íntimo de seu próprio temperamento e no de seu esposo. Dessa reflexão, imposta pela vida, sua sensibilidade se irritará, se você for egoísta, mas se for generosa, servirá para esclarecê-la cada vez mais, fazendo-a decifrar um gesto, um silêncio, uma suspeita; fazendo-a analisar as qualidades dos sentimentos que a animam.

Só depois que o casal faz essa penetração de caráter profundo e reciprocamente é que o amor conjugal atinge maturidade e será duradouro. Cria-se, então, um ambiente de companheirismo, de assistência mútua e doação.

Dê, minha querida inexperiente, à expressão “assistência mútua” um sentido mais amplo, mais humano, o que significa não fazer todas as vontades, aderindo aos caprichos do outro, mas ajudá-lo de tal modo que pareça até oposição. A aceitação interior do outro se revela por uma atitude de repouso e serenidade, pelo abandono de irritação do amor próprio e de exigências insatisfeitas.

Tudo isso é sabedoria que, às vezes, infelizmente, só aparece no limiar da velhice, parecendo até senilidade aos olhos menos esclarecidos.

Aceitar a vida como é revela mentalidade adulta que nem sempre concorda com a idade cronológica.

Quem não souber receber a vida conjugal com todos os sacrifícios e renúncias será incapaz de aceitar o próximo, inclusive os filhos, esses selvagenzinhos forjados por nós.

Todos os reveses do amor humano prendem-se à falta de sentido dos outros. Casamento, minha querida, tem duas finalidades: uma que se refere aos interesses individuais dos cônjuges, outra relativa ao bem dos filhos, da família e da sociedade. Por serem diferentes, só podem permanecer em hierarquia. Quando a primazia cabe aos cônjuges, então o casamento é o fim de uma estória de amor a par de um crime de lesa-sociedade; mas na concepção de um humanismo integral, a felicidade caberá aos filhos, à família e à sociedade, e a união será um bem comum.

A família é o lugar onde se experimentam as relações humanas, onde se fermenta a injustiça maior, a da atmosfera das nações.

O verdadeiro valor da maternidade e paternidade, resultante do amor conjugal consciente, que atingiu o nível de maturidade, tem sido desfigurado e até ridicularizado, mas as consequências se refletem na sociedade atual: completa desarticulação na vida social e profissional; cargos de direção nos partidos políticos e nas profissões revelando agressividade egoísta, intolerâncias lastimáveis.

O homem de hoje sente uma angústia, uma insatisfação reveladoras de imaturidade de amor, pela falta de conhecimento de si e dos outros. Por ter a vida espiritual anestesiada, procura a variedade, os acontecimentos fugazes, tudo que permita o esquecimento de si. A casa e a família não podem agradar a esse tipo humano tão saltitante.

Por tudo isso, minha jovem, ainda não lhe dou os parabéns, mas faço sinceros votos de que tenha coragem e muita moderação nesta maior experiência da vida que é o casamento.

Carta a uma noiva
Por Olga Brandão Cordeiro de Almeida

Fonte: Livro Caminhos Certos

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